O Grupão
O primeiro e o segundo ano tinham que ficar em fila no pátio e quando batia o sino seguiam acompanhando a professora até a classe, já o terceiro e o quarto subiam a escadaria de madeira no maior “tropé”.
Se fosse da turma da dona Neide tinha que usar gravata borboleta, ela era muito legal e carinhosa mas também muito rígida, ganhei beijos com marca de batom e também muita reguada normalmente de quina, isto quando fazia bagunça porque quando errava uma lição o castigo era levar puxão nas pelugens da costeleta, doía muito e ela fazia um desenho de macaquinho com caneta vermelha, se acertasse ganhava um beijo e uma estrelinha com caneta azul no caderno.
Na verdade, ninguém tinha raiva da professora por causa disto, muito pelo contrário, tentava melhorar para não levar mais puxão na costeleta, já a reguada de quina era mais frequente.
As turmas eram separadas em masculinas e femininas, sentávamos em carteiras de dois, ainda com buraco para tinteiro, mas já usávamos canetas a tinta recarregáveis e o mata-borrão era indispensável para não borrar o caderno antes da tinta secar, nesta fase não era permitido o uso de canetas esferográficas.
Alunos do primeiro Grupo Escolar de Ourinhos. De acordo com o Blog “Memórias Ourinhenses” é uma foto da década de 20 .O Grupão marcou época na história da educação ourinhense. Funcionou em dois endereços, o primeiro na Rua Paraná e o segundo na esquina da Rua 9 de Julho, onde hoje funciona a Diretoria de Ensino, no centro de Ourinhos (Foto: Memórias Ourinhenses)
Eu não via a hora de chegar ao terceiro ano para não seguir mais em fila e sair atropelando por aquela escadaria, mas dei azar, primeiro porque repeti o segundo ano e isto fez demorar mais um pouco, depois porque quando fui promovido, o terceiro e o quarto passaram para as salas de baixo, me dei mal, mesmo porque a diretoria era em baixo e eu vivia lá.
Na diretoria tinha um armário com portas de vidro no qual ficava em exposição uma palmatória já em desuso, que fizera parte de um passado não muito distante, servia para intimidar, era meados dos anos 60, em plena ditadura militar, período sombrio de repressão, mas este tipo de castigo já era obsoleto por aqui.
Na hora do recreio éramos praticamente obrigados a tomar o leite de soja que vinha dos Estados Unidos, fruto do projeto Aliança Para o Progresso que visava distanciar os latino-americanos da ameaça comunista soviética que havia crescido após a Revolução Cubana.
Os alunos da caixa escolar (mantida praticamente pelas doações em dinheiro dos alunos que podiam ajudar, os valores vinham anotados mensalmente no boletim) tinham direito a sopa de fubá com couve ou sagu, quem não fosse da caixa tinha que comprar fichas caso quisesse a merenda.
Dia de vacinação era um sufoco, chegavam de surpresa, embora muitos conseguissem pular o muro e vazar quando viam a peruinha branca da saúde, era obrigatório tomar todas as vacinas, talvez tentássemos a fuga por não ter noção da gravidade de uma epidemia ou pandemia, mas de um jeito ou de outro depois acabava tomando.
As brigas normalmente começavam no pátio durante um jogo de “bafinha” com figurinhas do Rin Tin Tin e ficavam para ser resolvidas na saída.
A divulgação ia rolando criando uma grande plateia, formava-se uma roda, começava com um intermediador que separava com a mão os rostos dos dois e dizia: "- Quem for homem cospe aqui", tirava a mão e começava a briga, só parava quando um pedia água (rendia-se).
Não tinha cantina, mas na saída tinha o carrinho do “Loredo” com uma grande variedade de atrativos que ele mesmo produzia para a criançada, tinha: caixinha da sorte, bala premiada que ele abria, escrevia a lápis o prêmio na parte interna do papel que era meio fosco e tornava a embrulhar, um apito feito de taquara e bexiga que imitava miado de gato, raspadinha de gelo com groselha ou essência de abacaxi, slide de mulher de biquíni, ele mesmo segurava o “projetorzinho” manual, tinha que ver rapidinho.
Além de outras coisas que ele vendia, como: "Pedaços de cocô in natura que ele trazia em um vidro grande e vendia os pedaços com preços variando de acordo com o tamanho de cada um, tinha também laranjas descascadas com uma maquininha, entre outras coisas que faziam a nossa alegria." (Biru)
As outras opções de alimentação eram: a cocada da baiana, a “martelinha” (quebra queixo) algodão doce, pipoca e o bolinho de carne do "bolinheiro". Um ou outro parecia com cocô de rato ou dessas “pipoquinhas” doces de saquinho vermelho comprado na quitanda.
Assim era o Grupão (Grupo Escolar Jacinto Ferreira de Sá), quem não passou por lá naquela época, certamente não escapou do Grupinho (Virgínia Ramalho), do Esmeralda na Vila Nova, ou estudou no Sesi, o resto acho que era quase tudo escola rural.
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