Por João Neto; 40 anos da partida de Ourinhos

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No dia 04 de março de 1982 fui embora de Ourinhos.

Pra comemorar os 40 anos da minha partida deixo registrada minha homenagem à cidade que guardo no meu coração.

"O menino e a cidade!

Ah, Ourinhos!

Talvez você não tenha se dado conta dos tempos em que estive atrelado às suas asas.

Te conheço desde os tempos em que eu, menino, era apenas um rascunho de gente, cheio de sonhos e prioridades.

O sonho era a riqueza material, as prioridades eram as necessidades básicas.

Ah, Ourinhos!

Conheço seus rios e seus ventos; pisei no seu chão quando seu chão era chão de terra vermelha.... Sério, deixei nas suas ruas de terra as digitais dos meus pés descalços, pode conferir, basta retirar a camada de asfalto que cobre a Rua Brasil, a Barão do Rio Branco e a rua do Seminário... Minhas marcas estão lá, tatuadas e indeléveis.

Sim, talvez você não se deu conta da minha presença, insignificante que eu era.

Eu, do meu lado, curtia toda sua hospitalidade, só comparada ao colo de mãe.

Corri atrás de bola no campo do seminário... Rezei na Paróquia Nossa Senhora de Guadalupe.

Para a escola íamos todos juntos, feito folhas ao vento, inofensivos, uniformizados,  radiantes; a gente brincava de ser feliz.

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Nas noites quentes, nossas mães colocavam as cadeiras nas calçadas e a gente brincava sob seus olhares, brincávamos de tal forma que o suor e a poeira formavam um cordão de craca no nosso pescoço. Sem contar a caça aos vagalumes com suas moderníssimas bundas de "led", que a gente esfregava na camiseta branca pra refletir o brilho do nosso olhar.

Lá pelas nove da noite as mães gritavam:

- Vamos pra dentro, está tarde!

- Ah mãe, já?... Só mais um pouquinho!

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Sim Ourinhos, eu cresci na sua plenitude. Nadei nos seus rios, usufruí de sua luz, namorei suas meninas.

Um dia fui embora, mas, sinceramente, acho que apenas meu corpo embarcou no trem da partida, ainda que eu insista em tentar escrever algo diferente do menino que fui, a minha alma sempre estará presente na sombra de suas chaminés!

Qualquer dia eu volto!”

Este texto é do escritor João Neto, um escritor do cotidiano, foi rotulado, pelo crítico Lau Pacheco, como "piloto da caravela da saudade", em virtude do resgate de momentos vividos na infância e adolescência em Ourinhos.  

Após ter seu conto "Ainda Bem Que Você Veio" viralizado nas redes sociais, ficou conhecido em todo o Brasil. Publicou seu primeiro livro de contos e crônicas em 2019.

João Candido da Silva Neto nasceu em Santa Cruz do Rio Pardo (SP) e veio para Ourinhos com 7 anos em 1967. Ele atuou na COPEL (Cia Paranaense de Energia) onde aposentou-se em 2019. Em 2012 se tornou escritor, tendo seus contos e crônicas publicados semanalmente na Folha de Londrina.